Ainda o novo ano não tem quatro dias e já quase todas as resoluções tomadas antes do estado de embriaguês se ter apoderado de nós há quatro noites atrás foram por água abaixo. Não estamos a cumprir as promessas que havíamos feito a nós próprios nos últimos dias de 2005. Afinal ainda não foi desta que deixámos de fumar, beber, snifar cola. Ainda não foi este ano que abdicámos da carne para nos tornarmos vegetarianos. E a dieta também pode começar no dia seguinte. Ainda não nos habituámos à ideia de telefonar mais vezes à mãe, ou à tia do Porto. Continuamos sem escrever aos amigos da Secundária. Ainda não calçámos os ténis velhos para fazer a tal corridinha e desculpamo-nos com o frio que faz lá fora num acto patético de auto-indulgência. Aliás, quaisquer que tenham sido as nossas sinceras promessas no final de 2005 para levar a cabo a partir do primeiro dia de 2006, vão-se escoando por um farrapo de motivos que vamos utilizando como desculpa para a má vontade. Mas não se sintam mal com a vossa consciência. Não alimentem a culpa nos vossos corações. Não deixem que o peso do remorso roube a aparência de conforto da vossa patética existência. Hei… a culpa não é nossa. Somos apenas o fruto de uma sociedade cada vez menos comprometida consigo própria. E se mais ninguém assume nada do que havia prometido, porque haveríamos nós? Acaso somos especiais? Acaso importamos? Ainda há alguém que nos leva a sério? Então para quê considerar-nos a nós próprios? Não estávamos a falar a sério… foi só um delírio momentâneo induzido pelo clima natalício… esse malandro que nos prega partidas à consciência!... Afinal… as promessas, toda a gente o sabe, nem sempre são para cumprir. Aliás… o verdadeiro desafio da promessa não está na sua realização, mas na qualidade da desculpa que temos que inventar – para os outros a para consolo próprio – para não ter que a executar. Perguntem a qualquer político… E para além disto tudo, sempre que aquela pontinha de remorso – que insiste em não partir das mentes mais conscienciosas – atacar, lembrem-se que neste curto espaço de três dias coisas piores fizeram balançar a harmonia da Santa Quadra: A Rússia cortou o abastecimento de gás ao resto da Europa porque não se dá com a Ucrânia. A Ucrânia ameaçou explodir o gasoduto porque não se dá com a Rússia. Os árabes aumentaram o preço do barril do crude porque não se dão com os americanos. E os americanos bombardearam mais um país de terceiro mundo – para levar a democracia ao povo, não foi por causa dos jazigos de petróleo – porque não se dão com ninguém. Por cá, e em igual período de tempo, o Porto quis contratar um jogador só para lixar o Benfica. O Benfica foi ao Brasil buscar o craque só para lixar o Porto. Um amigo do craque e do Porto veio atrás deles e também se lixou com a mais bem dada chapada que a televisão já transmitiu ao vivo. As gasolineiras aumentaram os combustíveis e o gás. Os bancos decidiram ampliar o valor das prestações do crédito à habitação. Os impostos sobre o pão e o leite vão aumentar. O Estado tenta protelar as decisões mais polémicas até ao início do próximo Mundial de Futebol na esperança de que o povo não pense em mais nada. Uma reacção, aliás, compreensível, já que, para o terço de cidadãos que vive no limiar da pobreza no nosso país, é mais importante discutir a internacionalização da Galp e da EDP, vendidas a retalho a empresas italianas e espanholas. Ao contrário das promessas feitas em 2005 o Governo também não vai poder aumentar os salários na proporção do crescimento da inflação. Nem reduzir o défice. Nem cumprir o Protocolo de Quioto. E sentem-se vocês culpados… tss…tss. Vá lá. Relaxem. Que o remorso não vos impeça de fumar, de beber, de cheirar cola, de meter p’rá veia, ou de qualquer outra coisa que vos ajude a passar os próximos 360 dias. De preferência numa espécie de transe etéreo. É que este… vai ser um ano muito longo! |
Como gesto de boas vindas ao blogueiro, aqui vai a minha contribuição ao teu 1º post:
Resoluções para 2006